Ultima atualização 16 de julho

Coparticipação e franquia: a dor de cabeça das operadoras

Beneficiários terão mais liberdade para o atendimento; operadoras dos planos de saúde correm para se adequar às mudanças

A Resolução Normativa nº 433, que atualiza as regras para a aplicação da coparticipação e franquia em planos de saúde, publicada pela ANS no Diário Oficial da União, e que entra em vigor em 27 dezembro desse ano, acendeu o sinal de alerta das operadoras de saúde e deu mais opções para os beneficiários dos planos.

A norma estabelece que o paciente pague até 40% na realização de procedimentos e determina limite para gastos com franquia. A decisão também listou áreas em que não será permitida cobrança extra, o que não acontecia anteriormente. Agora, as regras impedem que haja cobrança de coparticipação e franquia em mais de 250 procedimentos, como exames preventivos e tratamentos de doenças crônicas, entre eles, tratamentos de câncer e hemodiálise.

“Identificamos um crescimento exponencial no número de beneficiários em planos com coparticipação e franquia. Atualmente, mais de 52% dos beneficiários possuem contrato com um desses mecanismos, por isso tomamos essa decisão”, afirma Rodrigo Aguiar, diretor de Desenvolvimento Setorial da ANS. “Além disso, tais mecanismos eram regulamentados por uma norma antiga e não aderente à atual realidade do setor”, diz.

Rodrigo Aguiar

Rafaella Matioli, diretora de Consultoria de Saúde e Benefícios da Aon Brasil, também diz que “esses mecanismos de regulação já são utilizados amplamente por empresas brasileiras, 45% de 219 empresas possuíam coparticipação ativa em 2011 e 67% de 536 empresas possuíam coparticipação ativa em 2017, o que demonstra a evolução deste tipo de contratação. Essa já era uma tendência do mercado. Em muitos casos, o que leva a escolha desse modelo é a tentativa de fomentar a utilização mais consciente da assistência médica”, ressalta.

Para Anselmo Antunes de Carvalho, gerente Comercial e Marketing da TNH Health, startup que desenvolve soluções para a área de saúde, “o setor sempre foi muito conservador e, até meados dos anos 2000, navegava em um ‘blue ocean’, no qual a gestão era baseada na expectativa de que os custos com sinistralidade seriam de 25% ou 30%, e as operadoras teriam mais de 50% lucro. Todavia, com a aplicação de perfis mais focados em resultados e analíticas profundas, percebeu-se o grande buraco que foi gerado”.

Anselmo Antunes de Carvalho

De acordo com a presidente da FenaSaúde, Solange Beatriz, “além da preocupação do consumidor em realizar procedimentos necessários, com a nova regra, as operadoras terão gastos menores, já que parte das despesas será custeada pelos beneficiários”. A visão otimista da executiva alia-se a ideia de que as mensalidades dos planos tendem a cair com a Normativa nº 433, o que “garantirá um maior equilíbrio econômico-financeiro às empresas do setor e a própria sustentabilidade do sistema”.

Já o médico e sócio-diretor das healthtechs B2Saúde e Carelink, Francisco Vignoli, diz que as mudanças podem ter ocorrido também pelos impactos que o mercado global de saúde sofreu nos últimos 20 anos. “Os planos de saúde, em 1998, representavam, em média, 4% ou 5% da folha de pagamento das empresas. Hoje, está em quase 13%, apontando para 20%. Isso faz com que as organizações se preocupem com isso”, declara. “Vimos que a Amazon, por exemplo, uniu-se a empresas parceiras para buscar novos modelos de planos de saúde”, completa.

Solange Beatriz

Onde tudo começou

Em meados de 2016, os debates sobre uma possível atualização das normas ganharam vigor, tendo sido constituído um Grupo Técnico específico sobre o assunto para ampla discussão com a sociedade. Na sequência, o tema passou por audiência pública, consulta pública, e, por último,  foi realizada pesquisa aberta à participação de toda a sociedade. A consulta pública recebeu cerca de 1.140 contribuições da sociedade e a pesquisa contou com 645 contribuições.

Estudos realizados na Análise de Impacto Regulatório, que fundamentaram a edição da norma, apontaram que atualmente produtos com coparticipação e franquia são comercializados com o valor médio 20% menor do que os sem tais mecanismos. “Acredito que as alterações realizadas não reduzirão essa diferença de preços e possibilitarão uma maior diversidade de produtos, prestigiando a escolha do consumidor”, declara o diretor da ANS.

Francisco Vignoli

Outra característica da norma é a possibilidade que as operadoras terão de premiar clientes que tenham bons hábitos de saúde e oferecer descontos para aqueles que tiverem destaque.

O gerente da TNH Health tem uma visão otimista quanto as novas regras e aponta uma mudança de comportamento tanto das operadoras quanto dos beneficiários. “Esse novo formato, agora muito criticado, a médio prazo será bom para resgatar essa consciência tanto do uso quanto da prevenção e só isso já será um avanço tremendo. Agora, pense que a operadora vai poder ‘dividir essa conta’ com os segurados/beneficiários e, com isso, haverá uma mudança natural de comportamento, onde a fidelização dar-se-á não apenas pelos valores mas, principalmente, pelas ações preventivas que vão entregar”, conclui.

Rafaella Matioli

As regras só valem para contratos novos. As operadoras poderão continuar vendendo planos sem franquia ou coparticipação, mas os produtos com esses formatos deverão ser de 20% a 30% mais baratos. De acordo com a entidade, cerca de 50% dos beneficiários possui um dos dois tipos de plano, e esse seria um dos motivos para a atualização das regras. “Se por um lado os valores dos planos podem diminuir, por outro eles podem atingir um público que antes não era alvo. A nova norma também busca uma utilização dos planos de saúde mais saudável e, por consequência, menos onerosa”, defende Rafaella.

Os desafios

“Para as operadoras, criar mecanismos que dêem essa visibilidade de utilização e se padronizem custos, criando essa conscientização do uso correto será um grande desafio”, diz o diretor da TNH. “Já para as fontes pagadoras, seja PF ou PJ, a proficiência em equilibrar os custos será uma dor tremenda.”, analisa.

Solange acredita que o principal problema do setor é o atual ritmo de crescimento das despesas assistenciais, que precisa ser contido para manter-se sustentável. Segundo ela, o setor precisa de soluções, que acarretam em melhoras tanto para beneficiário quanto operadoras. “Com a busca por soluções que contenham a escalada dos custos, a ampliação do leque de produtos ofertados e a recuperação da própria economia, o setor poderá reaver gradualmente os beneficiários que deixaram de ter planos nos últimos anos em razão da crise econômica que assolou o País”.

Vignoli acredita que “os modelos dos planos de saúde não acompanhavam as novas estruturas do mercado”. Para ele, o setor ainda é muito conservador o que está acarretando nas críticas iniciais. “A ANS tem que ser muito clara no que vai exigir das operadoras. São apenas 180 dias para que um novo produto seja disponibilizado. A mudança deve sem bem vista e as operadoras, junto com o consumidor, têm de compreender a necessidade de se atualizar”, termina.

Audiência Pública

A ANS também publicou, no dia 10 de julho, no Diário Oficial da União (DOU),o edital com as regras para participação na Audiência Pública nº 10, que vai debater o reajuste de planos individuais. A atividade ocorrerá nos dias 24 e 25 de julho, das 8h30 às 17h30, no Auditório da Secretaria de Fazenda e Planejamento do Rio de Janeiro.

Os interessados devem se inscrever até o dia 20 de julho. Para isso, precisam enviar um e-mail para o endereço eletrônico [email protected], informando no assunto “Audiência Pública para Política de Preços e Reajustes”. O participante deverá indicar nome, CPF e a instituição que representa ou à qual é vinculado.

Maike Silva
Revista Apólice

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