Como é sabido, o Estado nunca deu à saúde, à educação e à segurança pública o real valor que a sociedade exige e merece, nos termos constitucionais.
No que se refere à saúde, há pouco mais de uma década vendia-se contratos de assistência à saúde sem que houvesse uma regulamentação eficiente e adequada para uma situação já caótica.
Assim, foi editada a lei 9.656 em 3 de junho de 1998 que dispõe sobre planos e seguros privados de assistência à saúde, legislação que vem sendo ampliada – Lei 9.961/00 – para atender a uma população cada vez maior com uma abrangência descomunal.
Hoje, existem quase mil operadoras e milhares de planos que atendem mais de 45 milhões de consumidores em todo o País. Pela legislação que criou os planos, o Estado também criou a Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS, que tem por finalidade e subordinação editar normas e a fiscalização sobre qualquer produto e serviço além de examinar as garantias de coberturas financeiras de riscos de assistência médica, hospitalar e odontológica que são comercializados por essas empresas.
Está se perdendo o controle. De acordo com a própria ANS, até o meio do corrente ano foram registradas quase 20 mil reclamações contra centenas de operadoras. A esmagadora maioria não foi resolvida, mesmo intermediando conflitos entre consumidores e operadoras. A agência sequer consegue proibir a venda dos produtos que estão sendo comercializados livremente até por operadoras em regime de suspensão.
Ante a deficiência e descontrole, as operadoras comercializam planos que ferem as mais comezinhas situações. Credenciam e descredenciam médicos, hospitais, laboratórios e afins sem a comunicação a seus associados; redigem cláusulas que permitem o cancelamento unilateral do contrato, tornando-as abusivas; não autorizam determinadas cirurgias ainda que o médico do paciente tenha prescrito; negam coberturas para casos de urgência e emergência; exigem o cumprimento do prazo de carência até para situações críticas; além de um número assustador de outras situações. Cada vez mais o Poder Judiciário é obrigado a intervir para resguardar o direito da população.
E o que faz a ANS? Quase nada, a não ser tentar disciplinar a matéria editando resoluções punitivas, como a RN 319, de 05 de março de 2013, resolução que obriga as operadoras de planos privados de assistência à saúde quando houver negativa de autorização de procedimento solicitado pelo médico ou cirurgião dentista, credenciado ou não, a “informar ao beneficiário detalhadamente, em linguagem clara e adequada, e no prazo máximo de 48 (quarenta e oito) horas contados da negativa, o motivo da negativa de autorização do procedimento, indicando a cláusula contratual ou dispositivo legal que a justifique”.
Essa resolução também acrescentou parágrafo único ao artigo 74 da Resolução Normativa 124, de 30 de março de 2006: “Na hipótese de a operadora deixar de informar ao beneficiário, na forma estabelecida pela regulamentação da ANS, os motivos da negativa de autorização do acesso ou cobertura previstos em lei ou contrato, a multa será de R$ 30.000,00 (trinta mil reais)”.
Feita a denúncia, constatada a irregularidade, aplicada a penalidade. Ao cofre de quem vai o valor da multa? Da ANS.
Pobre do beneficiário.
* Avalcir A. Galesco é fundador do escritório Galesco Advogados Associados, pós-graduado em Direito Securitário e Ressecuritário pela FGVLAW – Fundação Getúlio Vargas e professor da Escola Nacional de Seguros e da Pós-Graduação da Faculdades Metropolitanas Unidas – FMU.