Ultima atualização 25 de outubro

Redução de juros está no radar do mercado de seguros

Compensar negócios mal precificados com ganhos financeiros já não é mais possível em um cenário de taxas em queda

A décima redução seguida dos juros evidencia ainda mais a necessidade de as seguradoras fazerem na prática o que sabem melhor: subscrever e precificar riscos. Com a taxa básica da economia (Selic) em níveis bem abaixo dos padrões habituais, as companhias não poderão, segundo especialistas, compensar negócios mal desenhados com ganhos financeiros das aplicações de suas reservas técnicas. Isso porque o retorno das aplicações tradicionais, como renda fixa e DI, segue em queda acompanhando a tendência de juros baixos da economia brasileira. Para compensar a queda das receitas financeiras, as seguradoras terão de reforçar o lado operacional do negócio.

Afinal, por mais que as companhias de seguros estejam diversificando os seus investimentos, o perfil conservador deste público, que representa uma fatia relevante dos investidores institucionais do mundo financeiro, o limitará de ir mais longe. É fato que muitas seguradoras antevendo este cenário já fazem, desde o ano passado quando começou o ciclo de cortes nos juros básicos, a sua lição de casa. Aumentaram a fatia de investimentos em fundos de crédito privado, que investem em papéis de dívida corporativa e em opções mais arriscadas, mas com rentabilidade mais atrativa como os multimercados que apostam em vários mercados como ações, moedas, juros.

Também aproveitaram a oportunidade que lhes foi dada para comprar letras financeiras (títulos de bancos) para melhor remunerarem seus ativos.  No Grupo BB Mapfre, por exemplo, as letras financeiras já representam 4,3% dos ativos totais da companhia, totalizando R$ 322 milhões. Já a SulAmérica aumentou em 5 pontos porcentuais a parcela investida em títulos privados, para 23%.

Para a Superintendência de Seguros Privados (Susep), o cenário atual é preocupante, além de desafiador.  “A preocupação com a queda dos juros é ainda maior para as empresas de vida e previdência privada aberta que têm produtos, como o PGBL e o VGBL, cuja rentabilidade poderá oscilar neste período. Esse é um assunto que as empresas terão de administrar”, avalia Luciano Portal Santanna, superintendente da autarquia.

Mais do que nunca, a eficiência e a boa qualidade na administração dos recursos passa a ser uma prioridade para as companhias, segundo ele. Isso porque até então, na opinião do superintendente da Susep, as empresas estavam “muito confortáveis”, pois viviam um período de estabilidade da economia, inflação não tão alta, e juros elevados que facilitavam a administração de recursos. “Com a queda da taxa de juros, as seguradoras terão um desafio maior em termos de aplicação”, observa ele.

Neste contexto, a Susep conversa com o Ministério da Fazenda para promover algumas mudanças na lei que regulamenta a política de investimentos das companhias seguradoras e de previdência privada aberta a partir de uma demanda da Federação Nacional de Previdência Privada e Vida (Fenaprevi). O objetivo do debate atual é permitir que essas empresas tenham mais alternativas para diversificarem os seus investimentos. Dentre os temas que estão na pauta da autarquia está a possibilidade de as seguradoras passarem a investir em fundos de índice (ETF, na sigla em inglês). Tratam-se de carteiras compostas por ações de diversas empresas, que acompanham o movimento dos principais índices da bolsa de valores. No Brasil, esses fundos existem apenas no âmbito da renda variável. Mas a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) abriu recentemente audiência pública para alterar as normas que regulam os ETFs e permitir a negociação de fundos baseados em índices de renda fixa, que podem ser compostos por títulos públicos ou privados.

Segundo Santanna, a previsão da Susep é de que ainda este ano sejam divulgadas mudanças na regra que disciplina os investimentos das seguradoras. Toda esta diversificação faz parte do jogo atual. Mas, mesmo que suas equipes de gestão de ativos sejam eficazes na escolha das melhores opções de investimento, ainda assim a eficiência operacional das seguradoras será colocada à prova. “É desejável que o resultado das operações de seguros tenha mais evidência que o financeiro. Diante do processo de queda de juros é uma tendência natural que a parte financeira contribua menos. Esse é o outro lado da moeda do contexto atual. A sociedade toda está tendo que se adaptar. Não seria diferente para as seguradoras”, avalia Aloisio Villeth Lemos, da Ágora Corretora de Valores.

No segundo trimestre deste ano, os resultados de algumas seguradoras já foi impactado pelo cenário atual. Bradesco Seguros e SulAmérica, por exemplo, tiveram seu lucro líquido impactado em meio à queda da Selic. O ganho financeiro tanto de uma como da outra caiu mais de 25% no período. Para os próximos trimestres, analistas do mercado esperam a continuidade da pressão sobre a lucratividade das seguradoras em meio ao cenário de juros baixos e da menor contribuição do resultado financeiro.

Para a agência de classificação de riscos Fitch Ratings, o setor de seguros deve apresentar uma “ligeira”, embora não significativa queda na lucratividade, que tem sido caracterizada por uma média de 3,0% de retorno sobre os ativos (ROA) nos últimos três anos (2,7% em 2011).

A explicação para a menor lucratividade está nos números uma vez que a receita financeira é parte do resultado das companhias de seguros. De acordo com o economista e corretor Gustavo Cunha Mello, da Correcta Seguros, a receita financeira de todo o mercado de seguros equivale a 42% do EBITDA (medida utilizada para calcular o lucro da empresa antes de juros, impostos, depreciação e amortização) e cerca de 12% da receita de prêmios emitidos. Com a queda dos juros, esses indicadores são impactados e, consequentemente, o lucro das seguradoras também é pressionado para baixo. E é por trazer reflexos tão relevantes na estrutura do sistema financeiro que a queda dos juros é considerada por especialistas do setor uma das principais preocupações no mercado global de seguros.

Se antes a pressão para corte de despesas e controle da sinistralidade já exigiam dedicação por parte das seguradoras, no cenário atual, essas questões ganham ainda mais relevância, principalmente, em tempos que o índice de roubo e furto de automóveis está em patamares elevados e a frequência do seguro saúde também segue alta. Este ambiente já fez com que o mercado promovesse uma série gradual de reajustes nos prêmios desde o ano passado. Em 2012, não foi diferente. No seguro de automóvel, por exemplo, alguns especialistas acreditam que os preços estejam 20% mais caros quando comparados ao ano anterior. E novos aumentos não são descartados, ainda que pese uma concorrência mais acirrada no setor de seguros. “É óbvio que para manter o lucro líquido, considerando a queda nos juros, haverá uma compensação”, atenta Mello, da Correcta.

Ele explica que no primeiro semestre, as seguradoras perderam apenas 1% da receita financeira em comparação com os seis primeiros meses de 2011. Mas, se nada for feito, essa perda deve subir no segundo semestre, pois a queda dos juros continua, conforme o especialista. Por isso, Mello acredita que um reajuste de 2% nos prêmios é “bem razoável” para este segundo semestre.

Confira a reportagem completa na edição 168 (outubro).

Kelly Lubiato

Revista Apólice

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