Ultima atualização 31 de agosto

Seguro rural não acompanha crescimento do agronegócio

Goiás tem mais de 50% do seu território formado por pastagens e latifúndios rurais, sendo um prato cheio para a produção agropecuária

Localizado na região Centro-Oeste, na qual a atividade agropecuária tem grande destaque, Goiás apresenta extensas áreas de pastagens e lavouras, com quase 50% do seu território sendo formado por latifúndios rurais.

Hilda Sayuri

Em 2017, o Produto Interno Bruto (PIB) do Estado cresceu 80% a mais que a média brasileira. O cálculo, realizado pelo Instituto Mauro Borges, da Secretária de Estado de Gestão e Planejamento, retratou uma alta de 1,8% no PIB goiano, diante de 1% no Brasil. Como tem sido nos últimos anos, a agropecuária foi a grande responsável pela elevação dos PIB no Estado, que atingiu R$ 189,9 bilhões, registrando um crescimento de 21,5% em relação a 2016.

“Goiás vivenciou o ciclo mineratório que, após o seu fim, garantiu a agropecuária como a estabilizadora da sua economia até os anos 60”, conta Hilda Sayuri, advogada especializada em seguros. “A partir dessa década, verificou-se a opção por uma agricultura não mais de subsistência (arroz, feijão e mandioca) mas, sim, comercial, voltada para a exportação”, continua.

José Alves, proprietário da J Alves Corretora, fala dos fatores que também colaboram para o desenvolvimento das atividades rurais, sobretudo, das oportunidades de investimentos em seguros na região. “Ao contrário do Sul e Nordeste, que têm temperaturas mais extremas, temos um terreno mais fértil decorrente de um clima mais ameno por um período maior de tempo, o que nos coloca à frente de outros mercados”.

O produto

José Alves

De acordo com a Conselho Nacional de Seguros Privados (CNSP), o seguro rural é subdividido em três categorias. Dentre elas, o produto abrange coberturas ligadas às atividades agrícola, que engloba a proteção contra mudanças climáticas e perdas de receita na lavoura; pecuária, que garante a indenização decorrente da morte de animais causadas por acidentes ou doenças; e o seguro florestal, que cobre, principalmente, sinistros causados por eventos biológicos, meteorológicos ou incêndios.

Especialistas acreditam que o desafio desses produtos no Estado esbarra em fatores que impedem a exploração e o avanço do seguro, como a ausência de uma experiência confiável (inconsistência nos dados estatísticos); a falta cultura e preparação para a contratação do produto; e a estagnação das seguradoras para um atendimento adequado às necessidades de cada região.

“É preciso pensar o seguro rural como um instrumento propulsor para a economia do País, que tem um dos territórios mais férteis do mundo. Para isso, impõe-se a inauguração de uma nova configuração do produto, que deve ter o corretor do seguro, o segurador/ressegurador, o produtor e o Estado atuando em prol de uma mesma causa e não de interesses individuais”, analisa Hilda.

“A precificação da apólice parte de dados que são emitidos pelo IBGE, mas nem sempre as informações são confiáveis”, continua Alves. “Um plantador produz 60 sacas de soja por hectare, mas o Instituto pode alegar que ele produz apenas 50 sacas. Então a seguradora vai trabalhar em cima do número ‘oficial’, o que pode gerar um desgaste na negociação, culminando, inclusive, na desistência da contratação”, explica.

Rafael Castro

Indo na mesma linha, Rafael Castro, co-fundador da Pallas Corretora de Seguros, diz que o consumo do seguro rural ainda está muito ligado a uma percepção momentânea de risco, não sendo levado como um custo de produção pela maioria dos cultivadores. “O produtor precisa apostar em um parceiro segurador a médio prazo, para que possa gerar dados consistentes. Apenas assim, haverá uma análise personificada para mudar este cenário”.

O diretor-presidente da Markel Seguros, Leonardo Paixão, ressalta que “o fato de apenas 15% da área plantada ser coberta por seguro mostra que há muito por fazer”. Ele acrescenta que “nem todas as empresas têm interesse em investir nessa modalidade devido à alta especialização necessária e à volatilidade de resultados inerente ao agronegócio”.

É importante destacar que Goiás figura em quarto lugar no ranking nacional da produção de grãos, sendo essa marcada pelo cultivo de soja e milho, segundo dados do Sistema Estadual de Geoinformação de Goiás (Sieg/GO). Além disso, a pecuária também tem forte influência na economia estadual, como explica Hilda.  “No Estado, esse ramo conta com o um dos maiores rebanhos bovino do País. A produção de carnes impulsionou a exportação estadual e nacional no último ano, sendo um dos três estados que mais explora essa vertente”, salienta.

Leonardo Paixão

No Brasil

A importância dos produtos rurais não se limita apenas ao estado goiano. No País, os prêmios do seguro agrícola, por exemplo, totalizam cerca de R$ 2 bilhões por ano. Dez empresas do ramo possuem um faturamento acima de R$ 5 milhões, o que também é considerado um grande problema para a atividade, pois há concentração do capital. Apenas cinco seguradoras têm mais de 90% do faturamento total.

A atividade rural é tão importante que, parte do incentivo para o cultivo, principalmente ao médio e pequeno produtor, é feito pelo Governo Federal. O Programa de Subvenção do Prêmio do Seguro Rural (PSR), por exemplo, paga uma parcela do preço do seguro contratado pelos produtores nas seguradoras. A subvenção oficial varia entre 30% e 70% do prêmio, conforme a modalidade do seguro e a cultura agrícola.

Já o Plano Agrícola e Pecuário (PAP), instrumento que define as principais medidas de política agrícola a serem seguidas em um período de 12 meses, disponibiliza capital aos agricultores. O recurso oferecido pelo PAP 2018/2019 foi estabelecido em R$ 194,3 bilhões, valor que é 2,1% superior que ao disponibilizado no ciclo anterior. Dos valores cedidos para o crédito rural, R$ 153,7 bilhões compõem os recursos com juros controlados e R$ 37,4 bilhões com juros livres. Para o apoio à comercialização foram previstos R$ 2,6 bilhões e para a subvenção ao seguro rural, foram destinados R$ 600 milhões.

Paixão acredita que “a subvenção ao prêmio sólido viabiliza um seguro rural sustentável no longo prazo”. Ele diz que a participação do Estado em conjunto com a iniciativa privada “gera equilíbrio e diminui a verticalização do seguro”.

“Os programas de apoio são instrumentos fundamentais para a consolidação desse seguro. Estes devem estar atrelados a uma politica de longo prazo e não sujeitos ao humor político e interesses partidários”, opina Hilda. Para ela, outro fator preponderante para o desenvolvimento do setor rural é a abertura do mercado para resseguradoras. “Competitividade auxilia a expansão da economia e possibilita o poder de negociação. O mercado brasileiro teve sua abertura com a quebra definitiva do monopólio do IRB Brasil Re, pela Lei-Complementar 126/007, difundindo-se também a outras empresas”, completa.

Já Alves salienta que outro problema para a disseminação do produto esbarra na distribuição. “A divulgação do seguro rural não é bem feita. O produtor faz o seguro por uma imposição dos bancos, que exigem isso na hora de aceitar o financiamento, e não pela real necessidade. Com isso, nem sempre o interesse cai sobre os possíveis eventos. Nesse processo, perde-se rentabilidade”, diz.

“O tema agro ganhou bastante destaque devido ao seu papel econômico, o que atraiu tanto corretores quanto seguradoras, não se limitando apenas aos agentes financeiros”, destaca Castro. “O PSR, por exemplo, é uma ferramenta de suma importância para o avanço na adesão ao seguro rural. Mas os valores ainda têm que melhorar para suprir toda a demanda. O ramo continuará crescendo e será melhor visado pelo Governo”, finaliza.

Kelly Lubiato e Maike Silva
Revista Apólice

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