Ultima atualização 17 de novembro

Um novo tempo

As vendas online começam a mudar os processos do setor, mas nenhuma ferramenta digital deve substituir a figura do corretor de seguros no mercado

As máquinas de escrever e as câmeras fotográficas manuais desapareceram. Falando nisso, alguém ainda se lembra do fax? Certamente a nova geração não sabe como funciona uma transferência remota de documentos através da rede telefônica, assim como não faz ideia do que é viver sem celular, computador e rede social.

A evolução tecnológica mudou o comportamento da sociedade, sobretudo a maneira com que ela adquire produtos e serviços, e os modelos de negócios passaram a ser reavaliados em todas as atividades. Na corretagem de seguros não é diferente. Como em qualquer profissão, quem não se atualizar nesta área perderá grandes oportunidades.

“Terá seu espaço reduzido consideravelmente no mercado aquele que não investir na capacitação plena, inclusive dos seus colaboradores, e não utilizar adequadamente as novas tecnologias”, garante o presidente da Federação Nacional dos Corretores de Seguros (Fenacor), Armando Vergilio.

Os corretores entenderam o recado e agora passam a deixar sua marca também no ambiente digital, principalmente nas redes sociais. Um bom começo, considerando que mais de 85% dos internautas no Brasil e mais de 95% fora dele estão, necessariamente, conectados a uma rede social. A tendência é que, em curto prazo, grande parte da oferta de consumo venha necessariamente por estes canais.

“É preciso agregar valor para o cliente e estar atento ao perfil dos novos consumidores, que usam a internet para praticamente todas as suas tarefas diárias, inclusive de consumo”, salienta Vergilio, que denomina a tecnologia como uma forte aliada da categoria.

Desenvolvidas exclusivamente para eles

Muitas tecnologias são criadas para alavancar a produtividade do corretor. Um exemplo clássico é o sistema multicálculo para seguro de automóvel, que permite a cotação simultânea de valores em até 15 seguradoras. Porém, um critério cada vez mais importante é a facilidade de uso das ferramentas em qualquer lugar e momento, com a formalização da proposta em tempo real. Neste caso, os smartphones e os tablets podem ajudar esses profissionais, especialmente os que atuam em pequenas corretoras.

“Com as aplicações móveis o corretor consegue realizar cotações, efetivar endossos e digitalizar documentos de maneira rápida e onde o cliente estiver. Ou seja, ao invés de coletar as informações e a documentação para só depois enviar a cotação, ele pode fazer isso na hora, lado a lado com o cliente”, explica Rodrigo Corumba, vice-presidente de Financial Services da Capgemini no Brasil.

Na prática, se o segurado fotografar sua Carteira Nacional de Habilitação  (CNH) e sua apólice atual e enviar as imagens ao corretor via WhatsApp, basta o profissional confirmar algumas informações adicionais para que o seguro de automóvel seja cotado em várias companhias.  Nada mal para um processo que, num passado recente, levava horas ou até mesmo dias para ser concluído.

Outra novidade é a operação com a interação de chatbots, robôs que se instalam em chats e aplicativos mensageiros e conversam com o cliente, mas que também podem funcionar como intermediadores de diálogos junto de um atendente humano. Esta foi a aposta de Alfred Reinold Baudisch, CEO da Fred Tecnologia, que até o início de novembro deve apresentar ao mercado a plataforma Fred.

“O Fred possui um painel acessível via navegador web para que qualquer pessoa monte seus robôs de forma visual. Podem ser feitas pontes de comunicação e integração com sistemas existentes de qualquer natureza, desde que a integração seja adequada na criação do chatbot”, explica o executivo.

A plataforma é voltada a diversos segmentos e necessidades. Para o mercado segurador, apresenta
possibilidades que englobam todo o processo de pré-venda, venda e pós-venda. Segundo Baudisch, a solução mais clara é a realização  e cotações automáticas que levam em conta o contexto e o perfil do cliente que conversa com o robô.

“O corretor pode ter um robô próprio para efetuar as operações diárias da corretora automaticamente, como avisar sobre a renovação do seguro e sobre novas ofertas, emitir a apólice a qualquer momento, cotações
e vendas automáticas e envio de certificado. Caso necessário, pode entrar na conversa para dialogar com
o segurado sem precisar buscar informações”.

Há ainda as ferramentas que viabilizam a venda de um seguro oportuno ao local onde o cliente está, através
do envio de push notification por geolocalização pelo smartphone. Algumas corretoras já trabalham com este conceito, uma delas alerta os segurados que chegam aos principais aeroportos do Brasil sobre a cotação e a contratação de um seguro viagem.

“Qualquer corretora pode usar essa ferramenta e, assim, ofertar o seguro bike nos parques ou o seguro  automóvel nos feirões de fábrica das montadoras”, destaca Paulo Ribas, diretor de Soluções Mobile da Cedro Technologies, sugerindo ainda que os corretores acompanhem o movimento insurtech (empresas que atuam no mercado de seguros apoiadas em tecnologia).

Simples e eficazes

A maioria dos pequenos corretores aposta em ferramentas simples. Rogério Gonçalves da Silva Gomes, por exemplo, utiliza o Facebook na divulgação de sua empresa, além do WhatsApp para transmissões mensais sobre promoções e produtos das operadoras e seguradoras com as quais trabalha.

Como início de todo bom negócio, o proprietário da RGSegs Corretora de Seguros enfrentou dificuldades e até hoje mergulha para “achar o tesouro”. “Aprendo muito na prática e as mídias sociais me abriram um leque de opções. Por meio delas, tive a oportunidade de fechar e renovar seguros de clientes em outros estados”, declara Gomes, que opera em Bonsucesso, no Rio de Janeiro.

O executivo também recorreu a uma empresa especializada em criação de sites para corretores de seguros. Este canal, aliás, é requisito básico para alcançar o sucesso na internet, considerando que todo tipo de comunicação ou recurso utilizado pelo profissional no meio digital precisa de um ponto de chegada, seja para
o cliente comprar um produto ou deixar seu contato. “Um site bem projetado e voltado para conversão pode trazer muito resultado, principalmente para o pequeno corretor que ainda não conta com uma equipe de vendas”, explica o especialista em marketing digital para corretores de seguros, Thiago de Freitas.

Pouco explorado, o e-mail marketing também merece atenção, principalmente para relacionamento pré e pós venda. Hoje, a ferramenta passa por uma transformação de uso e, caso seja manuseada da maneira correta,
pode potencializar resultados e automatizar processos.

É preciso decolar

Já consolidada no varejo, a venda online engatinha no mercado segurador. Não por falta de interesse dos corretores, mas por questões fora de seu controle. “Na maioria dos casos, o corretor não dispõe de
recursos disponíveis para investir em novas ferramentas tecnológicas, pois suporta uma sufocante carga
tributária”, diz Armando Vergilio, da Fenacor.

O que também retarda essa evolução, segundo a própria categoria, é a dificuldade das
seguradoras em firmar parcerias. Junto com as corretoras, elas direcionam cada  vez mais seus processos
de venda e suporte de seguros para essas plataformas, forçando uma transformação mais rápida na forma de se fazer negócios no setor. No entanto, Joster Silveira Alves, da Duocor Corretora de Seguros, acredita
que poucas delas estão realmente preparadas para apoiar o corretor que, tecnologicamente, necessita
de estrutura de apoio e financiamento. “Os sites de grande demanda online precisaram buscar investidores e montar uma super corretora”, recorda.

O profissional atua na capital gaúcha e considera o investimento alto para algo ainda incerto, pois ao mesmo tempo em que desejam iniciar a venda online as corretoras esbarram em uma clientela que, apesar de interessada neste modelo  de venda, ainda gosta de saber que por trás do telefone existe uma pessoa pronta
para atendê-la no que for necessário. “O brasileiro cota online somente para saber o custo. Como não há muita diferença de valores entre a venda tradicional e a venda online, ele prefere manter o atual modelo de proximidade com o corretor”.

Pelo lado das seguradoras, a Liberty Seguros explica que tem como grandes objetivos a eficiência operacional e a inovação e, por isso, acredita que a implementação de novas tecnologias é fundamental para criar novas maneiras de relacionamento entre os corretores e as seguradoras.

“Sabemos que esse público está cada vez mais conectado e exigente, buscando a companhia por meio de vários canais. Oferecemos diferentes canais de comunicação para que os corretores possam escolher
aqueles que preferirem”, alega Etienne Gonçalves, gerente de Experiência Digital e Clientes da seguradora.

Entre esses canais estão o Meu Espaço Corretor, ambiente em que o profissional faz toda a gestão de seus
clientes e abre solicitações; o Clube Liberty, com descontos em diversos estabelecimentos; e um
aplicativo mobile em que conseguem acessar todo o portfólio oferecido pela companhia, facilitando a apresentação dos produtos para clientes. Há ainda o Diretório de Serviços Operacionais (DSO).
Implementado em 2015, a ferramenta foi desenvolvida para complementar o atendimento por chat e telefone e atender as demandas operacionais que anteriormente eram tratadas por email.

“Nosso desafio é oferecer conveniência, simplicidade e segurança no atendimento aos corretores. Por isso, entre outras iniciativas, nossos próximos investimentos estão relacionados às plataformas de treinamento e desenvolvimento dos corretores, para que eles se sintam cada vez mais conectados à Liberty”.

Porém, os entraves não acabam aí. CEO da Thinkseg, André Gregori alega que o seguro ainda esta aquém do que  poderia trazer em termos de inovação e, assim, o corretor fica sem opção. “O profissional acaba respondendo só pelo preço porque não tem como apresentar um produto diferenciado. Na outra ponta, o consumidor final tem apenas a percepção em termos de cifrão e não do valor que um novo produto pode trazer. A tecnologia tem força para mudar esse cenário”, pontuou o executivo durante um seminário promovido pela Associação Paulista dos Técnicos de Seguro (APTS), em São Paulo.

Com o uso das novas ferramentas, o setor terá a missão de trazer simplicidade tanto aos usuários quanto aos operadores de seguro – obviamente, sem prejudicar  nenhum agente do setor. Prestes a entrar no
mercado como uma seguradora digital, a alternativa encontrada pela empresa foi criar uma plataforma que agregasse todos os serviços oferecidos pelas seguradoras, com o corretor de seguros e o próprio indivíduo
como principais agentes de venda e de relações públicas.

“O corretor é a peça-chave do nosso negócio. É importante que o apoiemos através da tecnologia para que ele renasça e consiga trazer novos produtos. Não dá para ignorar a figura deste profissional”, diz Gregori, salientando a importância de se desmistificar o mercado de seguros de venda online.

Insubstituível

A adoção da tecnologia é um movimento irreversível. E enquanto seu avanço permite que novas oportunidades de trabalho surjam no mercado, outras profissões devem ser extintas. De acordo com uma análise feita pela consultoria Ernst & Young, até o ano de 2025 a tecnologia substituirá um em cada três postos de trabalho. Já as profissões operacionais, como operador de telemarketing, caixa e árbitros, podem desaparecer ainda mais cedo, em apenas nove anos.

Alguns corretores de seguros temem que o mesmo aconteça na área, sendo talvez este o motivo pelo qual ainda se  mostram conservadores quanto a este  assunto. Contudo, o presidente da Tokio Marine, José Adalberto Ferrara, acredita que as novas abordagens de venda não devem afetar negativamente o setor.

“O mundo muda a todo instante. Isso é uma ameaça? Tudo é, mas não vejo um mercado tão forte como o de seguros, que representa 6% do Produto Interno Bruto, ser prejudicado por uma tecnologia que possa se tornar um grande disruptor do modelo existente”, pontuou o executivo durante entrevista ao vivo concedida para a Revista Apólice.

Ao mesmo tempo, Ferrara alerta sobre as companhias que realizam a venda direta sem o envolvimento do
corretor. “Essa prática não faz parte dos nossos planos, mas de qualquer forma não acredito que isso se tornará uma commodity no mercado”, disse ele, na ocasião.

Não há mesmo motivos para se preocupar. O corretor é o único profissional  apto a analisar as necessidades e  coberturas dos riscos que os clientes querem mitigar, selecionando, formatando e estruturando os produtos mais adequados para cada situação. Por isso, o especialista Thiago de Freitas assegura que, mesmo com o uso intensivo da tecnologia digital, o papel do corretor na cadeia de valor do negócio de seguros continuará sendo extremamente relevante. “Nenhuma ferramenta vai substituir o bom vendedor, o atendimento diferenciado e as condições de negociação. Ela apenas potencializará essas características e economizará o tempo e o esforço do profissional”, pontua.

Neste novo cenário, o uso de plataformas que facilitem o processo de exame, seleção de produtos e de coberturas de  riscos e serviços associados, simuladores de cálculo do prêmio para os múltiplos cenários
escolhidos será um diferencial importante na conclusão do negócio e na satisfação dos clientes. E brigar contra este fato só vai retardar a adaptação do corretor, que mais cedo ou mais tarde terá que utilizar dos recursos para sobreviver no mercado. Neste caso, a grande questão não é a ameaça das novas mídias, mas sim a maneira com que o profissional as utiliza.

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*Matéria por Lívia Sousa – veiculada originalmente na edição 215 – outubro/2016

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